Obras públicas monumentais, ficção e o regime militar no Brasil (1964-1985)
Sophia Beal
A ditadura militar brasileira usou obras públicas de forma decidida como uma narrativa de progresso. O regime concentrou-se na promoção de projetos de grande visibilidade, capazes de quebrar recordes nacionais e internacionais por suas dimensões. A ponte Rio-Niterói, por exemplo, era a mais longa do mundo no seu gênero na época em que foi terminada, em 1974. Ao se concentrar em grandes projetos, a ditadura militar gerava uma agitação em torno de suas realizações, na esperança de ofuscar o caráter regressivo de sua política social. Instituiu até uma semana nacional do transporte, organizou uma antologia de obras literárias ligadas ao tema e promoveu um concurso para o melhor poema sobre a rodovia Transamazônica, que estava construindo. Assim, o regime simultaneamente realizava grandes obras públicas e construía uma narrativa sobre o seu significado para os cidadãos. Ao mesmo tempo, essas obras foram tematizadas pela ficção contemporânea. Por quê? Minha hipótese é que retratos imaginosos de tais obras ajudaram artistas a criar tensão dramática, humor e posturas éticas que eram culturalmente relevantes para os seus leitores. Além disso, a ficção oferecia um espaço criativo para se explorarem conotações simbólicas alternativas dos projetos cultuados pelo regime militar.
Palavras-chave: Ficção brasileira; Domingos Pellegrini, Dias Gomes, ponte Rio-Niterói, rodovia Transamazônica, ditadura militar brasileira.
The Brazilian military dictatorship actively used public works as a means of narrating national progress. The regime focused on promoting high profile public works projects that would break national and world records for their size. The Rio-Niterói Bridge, for instance, was the longest bridge of its kind in the world when it was completed in 1974. By focusing on large projects, the military dictatorship generated a buzz around public works achievements in the hope of obfuscating its regressions in the area of social progress. It even instituted a national transportation week, organized an anthology of literature related to transportation, and held a competition for the best poem about the Transamazon Highway, which the government was building. Thus, the regime simultaneously constructed public works and narrated the meaning of this construction to its citizens. At the same time, public work projects made their way into contemporaneous fiction. Why? Imaginative portrayals of public works, I argue, helped artists develop dramatic tension, humor, and ethical stances that were culturally relevant to their readers. Moreover, fiction provided a creative space for exploring the alternative symbolic connotations of the military regime’s prized projects.
Keywords: Brazilian fiction; Domingos Pellegrini; Dias Gomes; Rio-Niterói Bridge; Transamazon Highway; Brazilian military dictatorship.